segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Big Sam, e o velho Morcego 204


Big Sam, como era chamado, o desconhecido da estrada.
Falava pouco, e por isso, pouco se sabia desse velho homem.
Possuía uma velha caminhonete, contudo, potente como um corcel bem tratado e forte como um leão viril e corajoso, a qual ele denominava "Morcego 204".

Big Sam aparentava ter um amor especial pela caminhonete... algo completamente bizarro.
Não tinha família, ou amigos. Todos temiam-no, pois algo em teu passado aterrorizava os preconceituosos.
Diziam que Sam envolveu-se numa briga em um pub - desses, em beira de estrada - e matou dois homens.
Outros, falavam que Sam não tinha moradia, pois havia assassinado a ex-mulher, e que a mesma assombrava a casa.

Estórias. Quem falava a verdade?

Tinham, também, as pessoas que diziam apenas que Sam era um velho caquético e anti-social;
Outros, diziam que o mesmo era tímido por causa de problemas familiares.

Bem, só digo o que já vi... Sam tem um bom coração.

Posso dizer que tenho uma vida normal.
Trabalho no Posto 708, o bebedouro dos que tem sede por aventura.
Sam sempre abastece comigo, porém, fala pouco. Ou melhor, o bastante.

- Pode encher o Morcego. - pedia, falando de sua caminhonete.

Contudo, em frente ao posto, uma senhora idosa guiando uma Opala 72, acertou um rapaz que dirigia uma Harley.
O pobre coitado, foi arremessado muito longe.
Big Sam pegou o velho Morcego 204, e correu para tentar ajudar o rapaz - nisso, a velhinha já havia se mandado.
Só ouvi Sam dizer:
- Volto para acertarmos! Desculpe! - disse, partindo com o rapaz ferido, logo em seguida.

Bem, não tardo a dizer que tudo passou por minha cabeça (essa é a desvantagem de se morar num lugar quase que isolado do mundo externo), desde Sam desmembrando o rapaz e vendendo os pedaços para alguma tribo de canibais, ou levando o rapaz para a cidade em perfeitas condições, e recebendo algum tipo de bonificação milionária pelo feito.

Já havia esquecido o fato, e Sam, já havia pago o que devia, quando o rapaz surge e pergunta:
- Onde está o senhor que socorreu-me aquele dia? Ele mora por aqui?
Expliquei a ele que nunca fiquei sabendo se Sam ao menos tinha uma casa.
O rapaz pediu-me um favor:
- Você poderia agradecer em meu lugar? Raramente passo por essa estrada, e temo que não possa agradecer ao senhor que me salvou... - olhou para baixo, respirou fundo e continuou - se possível, entregue isto à ele. - e entregou em minhas mãos, um envelope.
Respondi que sim, e o rapaz partiu, meio cabisbaixo.

Três semanas se passaram, e não tinha notícias de Sam.
Comecei a ficar preocupado quando o rapaz retornou para perguntar se eu havia entregado o envelope para Sam.
Disse que não via Sam, por quase um mês.
O rapaz mostrava-se decepcionado, e entregou outro envelope à mim, repetindo o pedido anterior.

Era domingo.
Recebi o jornal (entregue apenas nos finais de semana), e procurei por notícias que pudessem indicar algo relacionado a Sam.
Descobri na seção de finados, que Sam morrera de infarte.
A princípio, fiquei muito triste.
Achei que fosse maldade de minha parte, mas resolvi que abriria um dos envelopes, para ver do que se tratava:

"Pai, desculpe por ter ficado longe do senhor por todos esses longos anos. Achava que você fosse arrogante, egoísta, e ignorante, pois vovó nunca gostou do senhor, e falava coisas horríveis de ti. Tudo mudou, quando descobri que aquele homem que socorrera-me com tanto cuidado, era meu pai. Todas histórias, deboches, mentiras e fraquezas desintegraram-se para mim. Pai, volte pra San Francisco... temos muito para conversar

Joe"


É... acho que a vida não é tão justa.
Jurei a mim, que não abriria o outro envelope.
Não até minha pena por Sam esvair-se.

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